PORTINARI, Candido. Futebol. 1935, Brasil
Estou chorando um pouco hoje, os óio se enche d’água, que até a vista se atrapaia. É um choro que parece ser de melancolia, mas talvez seja nostalgia... De tempos da infância em que ouvia de tardezinha o vovô, meu vovô Oripe, o tio Oripe, tocando umas músicas que se misturavam ao vermelho promitente da nossa terra em contraste com o azul do céu e o verde intenso do horizonte. Morávamos todos em uma casinha de barro, com quatro cômodos, de tijolinho maciço rejuntado. A minha mamãe Francisca, quando chegava do trabalho, encerava a casa de piso vermelho com uma cera líquida que manchava a base dos móveis, e a tia Maria areava (polia) as vasilhas de alumínio de um modo tão mágico, que elas reluziam ao sol que se findava na tardezinha... Meu vovô tinha uma vitrola... Meu vovô tinha um olhar tão completo, e ele tinha palavras que se entendia sem voz, como se amasse mais do que o que podíamos contemplar. Éramos tão felizes, e eu era tão feliz...
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