O Brasil que a gente não vê, mas que dá audiência, é democrático

O Brasil é um país republicano e seu nome oficial é República Federativa do Brasil, um território organizado sócio-culturalmente por etnias diversas fundamentadas por três principais matrizes étnico-raciais, o povo português, as diversas etnias indígenas já existentes no território brasileiro antes da chegada dos portugueses e, finalmente, as diversas matrizes étnico-africanas transplantadas para cá com o fim de explorar as riquezas para a sustentação da Corte portuguesa, entre outras razões.

Torcedora chora após a derrota do Brasil, nas quartas de final da Copa 2010, no Vale do Anhangabaú, região central de São Paulo. Foto: Grizar Junior/AE


É importante salientar que este texto não se trata de uma aula de história, e nem por isso objetiva-se aqui recontá-la. Seu objetivo é mais genérico, é dorido e, ao mesmo tempo, cético. Pois, corre à boca pequena que o brasileiro não é muito afeito aos diálogos sérios. É muito bem difundido em conversas de mesa de bar e nos corredores das academias que o brasileiro é um cidadão que não se reconhece como tal, e que este é furtivo dos assuntos inerentes ao racismo (ainda que haja os defensores de sua inexistência em nossa República Federativa). Ele, o brasileiro, também rejeita os temas relacionados à cultura, política, economia, gênero, homossexualidade e sua homoafetividade e, finalmente, a tão difundida fome mundial.



O brasileiro tem suas preferências bem salientadas, o discurso comum sobre o futebol, que celebra os craques do momento regado a boas doses de louras bem geladas, o Carnaval responsável por agregar a maior parte da população em um ideal comum durante pouco mais de uma semana, e o sexo, que talvez seja o fator principal da relação que liga sujeitos comuns à sua vontade pelo poder e suas representações coletivas, enquanto detentores de verdades.

         
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A partir desse preâmbulo é possível entender que o Brasil é um território peculiar, diverso, intrigante e perigoso. Perigoso no sentido de sua política organizacional, no tocante ao processo histórico de sua ocupação, sua organização social e econômica e a relação de sua gente com sua cultura. Mas, me pergunto, qual é a cultura do Brasil? Quais são as caras dos brasileiros? Quais são seus nomes? Onde eles habitam e, por quê?


É muito certo que só nos atentamos ao fato de sermos seres humanos que respiram, quando o oxigênio nos falta, mas e quando nos falta cidadania, quando e como se revelará o sintoma de sua ausência em nós?

A República Federativa do Brasil foi constituída a partir dos ideários de uma democracia presidencialista, em que o cidadão brasileiro elege seus representantes em três esferas de poder público: o Municipal, o Estadual e o Federal. Estes três poderes reúnem um grande número de funcionários públicos responsáveis pela administração do dinheiro dos impostos que pagamos, o único objetivo deles é converter estes investimentos mantidos pelos cidadãos comuns em obras e projetos que facilite o ir-e-vir destes cidadãos, e promova o bem estar social com iniciativas públicas, em prol da saúde, educação, trabalho, urbanização, cultura e lazer.


O texto que promove e legisla sobre esse serviço se chama Constituição. A Constituição da República Federativa do Brasil foi construída no contexto da Proclamação da República, momento de transições e instabilidade sociocultural marcada entre as forças militares, o Governo, a Corte, trabalhadores livres, ex-escravos, negros, indígenas, portugueses e representantes de etnias africanas reminescentes no território. O texto da Constituição do Brasil mantém muitos resquícios dos ideais dessa época, incluindo o ideário do Positivismo criado na França por Augusto Comte, enquanto corrente de pensamento norteadora, juntamente com a Constituição dos Estados Unidos. A nova Constituição foi promulgada em 1891.


Em 13 de Maio de 1888 a escravidão no Brasil é abolida oficialmente, um ano depois em 1889 o Brasil deixa de ser Império e grita, em altos brados sua simbólica Proclamação da República do Brasil, formalizada em 15 de Novembro do mesmo ano. As mulheres brasileiras começam a votar oficialmente em 1932, os negros, estes ainda não podiam votar, não que fossem diretamente proibidos, mas porque estes eram analfabetos.


Mas por que os negros livres e escravizados no Brasil compunham uma maioria da população analfabeta? Por que estes respeitavam a Lei de número 01, de 04 de Janeiro de 1837, que determinava em seu artigo terceiro que eram proibidos de freqüentar as escolas públicas todas as pessoas, que padecessem de moléstias contagiosas, os escravos e os pretos Africanos, ainda que fossem livres ou libertos. Mas, eis que nem todos os negros eram analfabetos, há relatos documentais de negros que falavam mais de dois idiomas, além da evidência de negros ou escravos fulas, que liam árabe, devido sua religião muçulmana, e, também, de negros que serviam como acompanhantes em viagem, por serem bons negociadores e leitores. Em seus territórios de origem os negros recebiam educação de acordo com sua cultura e etnia, enquanto no Brasil, estes negros, quando aprendiam a ler o faziam na senzala ou nas taperas em que moravam, distantes do olhar docilizado de seus delatores.


Hoje, 17 de Maio de 2011, faz 123 (cento e vinte e três) anos e dois meses que a escravidão no Brasil foi abolida. Pouco, não é? E faz 79 (setenta e nove) anos que se tem o voto feminino computado nas urnas. E também 121 (cento e vinte um) anos de República Federativa no Brasil. Todas essas datas mostram que o Brasil é um país novo, que grande parte de seus cidadãos ainda vivem à luz do Império, da escravidão e do machismo que constituíram os alicerces deste território de ares emergentes.


Obs.: A seleção dos vídeos intercalados evidencia dois aspectos, sendo o primeiro a denúncia do sucesso de visualizações de uns com temática jocosa ou apelativa em detrimento de outros com conteúdo que leve à refelxão e ao debate, sendo todos eles considerados de grande sucesso no país por serem exibidos livremente em canais de televisão abertos ao grande público. E o segundo aspecto está relacionado às suas temáticas, compondo o grande interesse do brasileiro e, também, seu grande desinteresse.

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